Por todo o país, MPF tem recebido denúncias sobre ocupação ilegal de vagas de cotistas por não negros e não indígenas
O Ministério Público Federal (MPF) enviou, nesta terça-feira (8), recomendações à Universidade Federal do Pará (UFPA) e ao Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Pará (IFPA) para alertar sobre a necessidade de criação de Comissões Especiais de Verificação da Autodeclaração Étnico-Racial nos processos seletivos de alunos.
O objetivo é evitar e combater fraudes às políticas de cotas, preservando a real representatividade dos grupos aos quais a ação afirmativa é destinada. Em todo o país, o MPF tem recebido diversas denúncias de que não negros e não indígenas estão ocupando as vagas destinadas a estudantes pretos, pardos e indígenas.
O não cumprimento das políticas de cotas viola a Constituição, a Convenção Internacional sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial, a Convenção Interamericana contra o Racismo, a Discriminação Racial e Formas Conexas de Intolerância, a Lei de Cotas para o Ensino Superior, e jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF).
A Procuradoria Regional dos Direitos do Cidadão (PRDC), órgão do MPF responsável pela defesa dos direitos constitucionais dos cidadãos, estabeleceu prazo de 20 dias para que a UFPA e o IFPA se manifestem sobre as medidas recomendadas e também apresentem cronograma para a implementação urgente das comissões, caso as instituições acatem as recomendações.
Recomendações são instrumentos do Ministério Público que servem para alertar agentes públicos sobre a necessidade de providências para resolver uma situação irregular ou que possa levar a alguma irregularidade. O não acatamento infundado de uma recomendação, ou a insuficiência dos fundamentos apresentados para não acatá-la total ou parcialmente, pode levar o Ministério Público a adotar medidas e ações judiciais cabíveis para responsabilização civil, criminal e administrativa.
Detalhes das recomendações – As Comissões Especiais de Verificação da Autodeclaração Étnico-Racial devem realizar o procedimento de heteroidentificação complementar à autodeclaração racial de todos os candidatos cotistas, independentemente da existência ou não de denúncias sobre eventuais fraudes, recomenda o MPF. O procedimento deve ocorrer em todos os processos seletivos com cotas raciais para estudantes (graduação, pós-graduação, mestrado e doutorado).
Foi recomendado, também, que a UFPA e o IFPA estabeleçam como critério para verificação da autenticidade da autodeclaração racial dos candidatos cotistas as características fenotípicas destes, que deverão ser observadas, presencialmente, pela Comissão Especial de Verificação da Autodeclaração Étnico-Racial, cujas decisões motivadas serão adotadas por maioria dos membros.
UFPA e IFPA devem garantir que a composição das comissões atenda ao critério da diversidade, com distribuição de seus membros por gênero e cor, observando-se, tanto quanto possível, a procedência regional (relacionada ao contexto do local da seleção), aponta a recomendação do MPF.
Deve ser garantido, também, o efetivo controle e participação social no procedimento de heteroidentificação, em conformidade com os princípios da publicidade e da transparência, diz o MPF.
Para que essas garantias sejam asseguradas, deve haver a possibilidade de acesso de terceiros, mediante requerimento, à imagem dos candidatos cotistas, sem prejuízo de eventual responsabilização por divulgação não autorizada.
A realização de sessões de heteroidentificação devem ser abertas ao público, e é preciso que ocorra a divulgação dos nomes dos componentes das comissões, para possibilitar eventuais impugnações, recomenda o MPF.
UFPA e IFPA devem providenciar, ainda, a instituição de Comissões Recursais, compostas por membros não integrantes da comissão de heteroidentificação, com a atribuição para julgar os recursos interpostos das decisões da Comissão Especial de Verificação da Autodeclaração Étnico- Racial, registra o documento enviado às instituições de ensino.
Por fim, o MPF recomendou que a UFPA e o IFPA insiram – tanto no edital do vestibular quanto no manual do candidato – tópico específico sobre o funcionamento, composição e critérios objetivos a serem adotados pela Comissão Especial de Verificação da Autodeclaração Étnico-Racial, para permitir a participação da sociedade civil.