Rosa é o primeiro projeto individual do ex-vocalista da banda mineira, cuja sonoridade permanece em dez faixas inéditas
A separação de uma banda implica em diversos fatores, especialmente como a decisão irá respingar no futuro de cada um dos integrantes. Deixa a vida me levar para onde ela quiser, cantava Samuel Rosa, ex-vocalista do Skank, cujas atividades encerraram na turnê de despedida em 2023. O refrão de Vou deixar (2003) ilustra o atual momento da carreira de Samuel, que seguiu em frente, mas não esqueceu o passado. O artista preserva o DNA da banda mineira, o que se manifesta claramente em Rosa, seu primeiro álbum solo lançado ontem nas plataformas digitais.
Beatlemaníaco de carteirinha, Samuel viu de perto a performance de Paul McCartney de Hey Jude, em show intimista realizado para 500 pessoas, em Brasília, no ano passado. A experiência de ver a paixão com que Paul canta a mesma música há 56 anos lhe fez refletir sobre a necessidade de manter distância do Skank. “Eu brinco que o Paul mandou por telepatia para mim: ‘Samuel, não inventa, faça o que você sabe fazer”, lembra o cantor, que entendeu o recado, sem teimosia. “Eu quis soar eu mesmo, naturalmente, sem querer fazer um disco pretensioso. Deixei que o novo aparecesse de forma espontânea”, explica
Com 20 canções em mãos, Samuel e sua banda trabalharam juntos para escolher as dez melhores. Todas são unificadas por um denominador comum: o amor. As letras tratam das relações e suas diversas vertentes, exemplificado por Segue o Jogo, o primeiro single do novo trabalho, que fala sobre seguir em frente após o término de um relacionamento e manter as lembranças positivas de um amor que valeu a pena. Você pra um lado/Eu pro outro/Tá tudo certo/Segue o jogo, vocaliza Samuel no refrão.
“Eu não fiz a canção especificamente para algum caso. Fiz para coisas que vivi. E vejo nesses rompimentos o quanto de culpa que carregam as pessoas. As pessoas que saem de uma relação sentem culpa e as que ficam, também”, pondera o cantor de 57 anos. Segue o Jogo e Não Tenha Dó ecoam tematicamente em suas reflexões sobre o desamor. Contudo, enquanto a primeira contempla o caminho após o fim, a segunda imerge na angústia da separação. “Não Tenha Dó é outra bossinha também, mas já é mais MPB mesmo”, conceitua Samuel.
O disco é autorreferencial na letra, na sonoridade e no título. Sem tempo a perder, Samuel planeja deixar sua assinatura musical como principal legado para as gerações futuras. “Eu quero me afirmar e me exercer. Às vezes eu fico assustado que tô entrando no último quarto de vida”. Ele destaca que isso também implica em não ceder às exigências da indústria musical contemporânea. “Eu sou de uma outra época, infelizmente ou felizmente. É tudo muito rápido, tudo muito frenético, muito ansioso. Mas eu não sei fazer música assim. Então, eu fiz do meu jeito, da minha maneira, nos modos que eu sei fazer música”.
Entre janeiro e fevereiro deste ano, o músico optou pelo isolamento no quarto de sua filha. Ali, ocorria o que Samuel descreve como ‘composição induzida’, trabalhando de três a quatro horas todas as manhãs. Após a pausa para o almoço, ele seguia para o estúdio, onde se reunia com os integrantes da sua nova banda, composta por Doca Rolim (violão e guitarra), Alexandre Mourão (contrabaixo), Pedro Kremer (teclados) e Marcelo Dai (bateria e percussão). “Era discipna mesmo, eu me comprometi a chegar todos os dias com uma música nova de tarde e mostrar para banda, ainda que fosse ruim, boa, média, sem julgamentos”, afirma.
Guiado por seus desejos e aflições, sem amarras, Samuel adotou a filosofia do refrão de Vou deixar. Ele superou momentos difíceis para viver uma nova era que resplandece ensolarada, evidente na música e no semblante sereno que carrega. “Eu fui tomando algumas decisões segundo minhas vontades, meus desejos, de forma muito espontânea. Então eu acho que não quero mais estar dentro de uma banda, Não foi fácil, não tem sido fácil, mas tem sido muito recompensador. Tem certos momentos que eu acho que estou beijando o céu, de tamanha plenitude”, pontua.