No coração do Brasil, a música brega se tornou não apenas um gênero, mas uma verdadeira religião para muitos. Recentemente, Recife e Belém se envolveram em uma disputa acirrada no Congresso Nacional pelo título de Capital Nacional do Brega. A aprovação do projeto que concede o título a Recife gerou controvérsias, com os belenenses se posicionando firmemente para reivindicar também sua parte nesse reconhecimento. Este embate é mais do que uma simples votação; ele simboliza a riqueza cultural que cada cidade traz ao gênero musical que, por muito tempo, foi subestimado.
A importância do brega nas culturas de Recife e Belém
O Senado aprovou na semana passada um projeto que concede a Recife a honraria de Capital Nacional do Brega. Desde então, um fervoroso debate tomou conta das redes sociais e dos meios de comunicação, envolvendo artistas e pesquisadores que defendem as contribuições únicas das duas cidades ao gênero. O senador paraense Beto Faro (PT) já se posicionou a favor de uma solução que contemple ambas as capitais, argumentando que “Belém tem uma trajetória histórica no desenvolvimento desse gênero musical”, que é uma junção de influências e estilos que teriam, segundo ele, suas raízes profundas na cidade.
A proposta e a reação
O projeto de lei foi aprovado na Comissão de Educação do Senado e agora aguarda a sanção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Embora a medida reconheça a relevância do brega como um movimento cultural e econômico, a necessidade de uma discussão mais ampla é evidente. O senador Humberto Costa, relator do texto, enfatizou a relevância do brega em Pernambuco, não apenas como uma expressão de resistência cultural durante a ditadura militar, mas também como um motor econômico para a região. A ligação da música com a identidade e a economia local é indiscutível.
Na cidade de Recife, o brega se destaca e se moderniza com o surgimento de novos artistas e movimentos, como o bregafunk. De cantores icônicos como Reginaldo Rossi a novas vozes como MC Loma e MC Elvis, a tradição se mantém viva e se reinventa a cada batida. Já em Belém, o tecnobrega ganhou notoriedade internacional, com artistas como Gaby Amarantos quebrando barreiras e recebendo prêmios relevantes, como o Grammy Latino.
Reconhecendo a pluralidade do brega
Thiago Soares, pesquisador da Universidade Federal de Pernambuco, explica que o gênero musical brega nasceu como uma derivação da Jovem Guarda, sempre ligado às classes populares e a uma cultura que aborda o amor e a dor de cotovelo. Ele destaca que, na verdade, ambas as cidades são berços do brega, embora cada uma tenha características próprias que enriquecem a cultura nacional. “A disputa sobre qual capital é a origem é, na verdade, uma questão política”, enfatiza.
Para Gabriel GG Albuquerque, a música brega se tornou um “conglomerado” que abrange diversas musicalidades e estilos regionais. O brega se reinventou ao longo dos anos, misturando influências que vão da Jovem Guarda ao funk, passando por ritmos latinos e tradicionais. Mesmo com a construção de identidades locais muito distintas, como o sertanejo em Pernambuco e a influenciada pela cultura caribenha em Belém, o tema amoroso e a representação da desilusão continuam a ser os núcleos que unem as diferentes expressões do brega.
Diferenciações regionais
As particularidades do brega em Recife e Belém são evidentes, conforme apontado por especialistas. Enquanto o brega pernambucano se desenvolve através de serestas e letras românticas, sendo o teclado o instrumento principal, o brega paraense, conhecido como tecnobrega, destaca-se nas festas de aparelhagem, com forte influência de ritmos latinos. Artistas como Chimbinha, do Calypso, refletiram essas influências em suas músicas e shows, criando um clima único que celebra a cultura local.
O brega se democratizou e agora faz parte do cotidiano das pessoas, inclusive com eventos como o Festival Recife Capital do Brega, que celebra anualmente a música e a cultura local. Politicamente, o brega ganhou reconhecimento até do prefeito de Recife, que, como parte de sua campanha eleitoral, incorporou o gênero em seus vídeos nas redes sociais. “Isso mostra não apenas a riqueza cultural de Recife, mas também de Belém”, argumenta Soares, enfatizando a necessidade de reconhecimento das contribuições de ambas as cidades no cenário musical.
Indiscutivelmente, o brega é mais do que uma competição entre cidades. É um reflexo das diversidades culturais de um país rico em tradições, onde a música se torna uma ponte que une corações e expressões. A batalha pela Capital Nacional do Brega continua, mas, independentemente do resultado, o que realmente importa é o valor que o gênero traz à cultura brasileira.